sábado, 5 de maio de 2012

NÚCLEO DE REAL ESTATE DA POLI - USP DISCUTE O COMPORTAMENTO DO SETOR NO BRASIL EM 2012

 Profissionais avaliam as influências dos impasses na economia mundial e ajustes estruturais da economia interna.

Introdução 
 Esta reunião, contando com a presença do economista Mauricio Kedhi Molan, que apresentou dados e projeções sobre a economia mundial e brasileira, discutiu eventuais influências da crise mundial no mercado de real estate durante o ano de 2012. O debate considerou o panorama internacional e nacional e os possíveis impactos no setor de real estate nacional. No cenário econômico, o Brasil tende a viver uma nova realidade, com taxas de juros mais baixas e as esperadas medidas do governo na busca de fomentar o crescimento. No setor de real estate se observa uma conjuntura compreendendo estoques mais elevados e menores volumes de lançamentos, quando comparados com os anos anteriores. Os comentários nos tópicos a seguir buscam identificar como cada fator de relevância na economia mundial e sua repercussão sobre a brasileira, além das questões internas, impacta o setor de real estate, derivando ou não mais recursos de investimento, ou induzindo compras e provocando ou não alterações no perfil e no volume da demanda.

Panorama Econômico Mundial
No cenário econômico mundial verificam-se sensíveis alterações recentes, do final de 2011 migrando para 2012. Na metade do ano de 2011 os mercados eram influenciados pela tensão provocada pelo quase colapso da zona do euro, associados a dúvidas sobre o comportamento dos Estados Unidos da América (EUA) relativamente à sua dívida. Ora este cenário já sofreu algumas alterações.

Economia Americana
Na economia americana, apesar da conjuntura econômica adversa, os consumidores continuam gastando, os investimentos cresceram de forma razoável no segundo semestre de 2011, o mercado imobiliário aparentemente já atingiu seu pior estado, com os indicadores de preços e oferta reagindo, ainda que de forma incipiente e sem apresentar um viés definido. Em relação ao cenário esperado para 2011 e início de 2012, os EUA cresceram acima do previsto. Entretanto, há diversos desafios a serem superados e que irão impactar no crescimento da economia. Um dos maiores é a necessidade de ajuste fiscal: o déficit que atualmente é de 9% do PIB deve chegar a 7% e este esperado ajuste de política fiscal diminuirá o crescimento.

Economia Europeia
Na zona do euro, o colapso foi evitado com a decisão do seu banco central de injetar moeda na economia, com isso quebrando-se um círculo vicioso - risco bancário e risco soberano. Havia desconfiança porque os bancos carregavam muita dívida pública, e vários dos seus membros não apresentavam capacidade de pagamento. Com a injeção de liquidez o risco diminuiu, mas o problema não foi resolvido - apenas houve um ganho de tempo para que governos façam os necessários ajustes nas suas economias. Alguns países deverão fazer um grande ajuste fiscal, como a Espanha, que tem que sair de um déficit de 8% do PIB para aproximadamente 4%. A maioria dos países têm problemas fiscais e de solvência, isso indicando que haverá ajuste das contas fiscais o que retrairá o crescimento dos países, em um ambiente no qual a contração de crédito já é substancial. Diferentemente dos EUA a reversão do problema de crédito na zona do euro será mais demorada, porque, na crise americana, para resolver os problemas recentes o governo tomou duas ações: emitiu moeda e comprou os títulos ilíquidos carregados pelos bancos. O banco central europeu está fazendo somente a injeção de liquidez e os títulos, no caso público, permanecem no balanço dos bancos, portanto, o desafio de reverter a conjuntura de contração de crédito é muito maior. A perspectiva para os próximos anos é de um período negativo em termos de crescimento para os países da zona do euro.

Economia Chinesa
Na China, a perspectiva de crescimento também é menor do que nos últimos anos, tendo em vista que durante longo período este país cresceu baseado nas exportações e, agora, os mercados importadores apresentam problemas econômicos, o que deverá fazer recuar a capacidade de compra dos mercados dos EUA e da zona do euro. A China tem um modelo de crescimento baseado no excesso de investimento, no patamar de 45% do PIB, e este modelo está chegando ao seu limite. De outro lado, começa a aparecer um processo de demandas salariais, o que vêm fazendo crescer a taxa de inflação, tendo o banco central (o estado) adotado medidas para contração da atividade econômica, visando conter a inflação. Com esse quadro, estima-se que a China não manterá o mesmo ritmo de crescimento.
Crescimento Mundial A conjuntura indica que o crescimento global e das grandes economias que ocorria nas últimas décadas não poderá se repetir nos próximos anos. O crescimento da economia global na década anterior ficou entre 4 e 5%. Diante da crise atual, é razoável esperar que o crescimento global não ultrapasse 3%, ficando a China próxima dos 8%, países emergentes no patamar dos 6% e as economias avançadas não superando 1,2%. 

Panorama Econômico Brasileiro

Impactos 
Para o Brasil, um crescimento mundial moderado implica na condição de crescer em um ritmo equivalente ao atual. O ambiente é de crescimento mais moderado, mas é um ambiente de maior liquidez global do que o ciclo de contração de crédito que se seguiu à crise americana. Alguns fatores influenciam mais acentuadamente o crescimento do país, como o preço de commodities que não deverá subir no mesmo ritmo. Sendo o Brasil grande exportador, quando cresce o preço de commodities é como se houvesse uma transferência de renda para o País, o que se deverá verificar em regime mais modesto.

Política atual  
Ações de governo devem procurar produzir impactos de crescimento no País. No passado recente, sob o governo anterior, o modelo de câmbio era mais livre, existiam metas de inflação e os juros eram administrados com foco nestas metas de inflação. O câmbio oscilava com intervenção moderada da autoridade monetária. Já no modelo atual, o governo tem meta de juros e objetivo de crescimento. Neste contexto, a inflação provavelmente será a variável de ajuste. Visando impedir um avanço da inflação, pode se esperar medidas macro-prudenciais com foco em controle de crédito e controle de preços de alguns produtos e serviços. Alteração da metodologia do IPCA-IBGE deve resultar em uma taxa de inflação de referência mais baixa o que estimulará a redução da taxa de juros.

Desaceleração setorial  
A atividade econômica em 2011 não foi tão baixa como era previsto. A desaceleração foi concentrada e forte em setores específicos como automóveis e indústria. A alta de salários em setores de serviços foi facilmente repassada, porém no setor industrial os produtos manufaturados não puderam aumentar seus preços no mesmo ritmo do crescimento dos salários. Os segmentos de construção, serviços e varejo seguiram gerando empregos na economia. As medidas de controle do câmbio diminuem o impacto na indústria porque desestimulam a importação.

Crescimento 
Em 2011 verificou-se desaceleração na economia, mas não aumento do desemprego. A crise externa naturalmente abala a confiança dos empresários, o que resultou em um impacto na importação de manufaturados e na indústria. Os indicadores de confiança do consumidor, porém, permaneceram acima da média. As expectativas para o crescimento da economia em 2012 estão no teto de 3,5%. O aumento do salário mínimo deve sustentar o crescimento da renda real e a contínua redução da taxa de juros até o inferido piso de 9% ano representa um estímulo importante para o crescimento.

Endividamento x Comprometimento da Renda  
Os dados mais recentes mostram que o endividamento das famílias em relação à renda subiu de 20% (2006) para 45% (2011). Ou seja, as dívidas estão crescendo fortemente. O crédito também subiu de 20% do PIB (2005) para 45% do PIB (2011). Mas a dívida do consumidor brasileiro ainda é baixa em comparação com outros países, quando observada a relação [dívida/PIB ]. Quando observado o comprometimento da renda das pessoas com pagamento de dívida, a relação permaneceu entre 18-20% (2005-2010), mesmo com o aumento substancial da dívida. Isso ocorre porque os prazos das dívidas se alongaram e porque a taxa de juros está menor, portanto, há praticamente o mesmo percentual de renda direcionado para o pagamento de dívidas. Para que o crédito continue crescendo é necessário manter o aumento da renda, alongamento de prazo e redução de juros. No período de 2005-2010 houve um forte crescimento de crédito, porém, a partir de 2011 iniciou-se um ajuste e consequente redução; resultado de medidas macro-prudenciais. Considerando a expectativa de redução de juros, associado a um aumento de prazo médio, mantida a tendência anterior, deve haver uma redução do comprometimento de renda e consequentemente espaço para novos endividamentos. Os indicadores mostram que a taxa de crescimento do crédito compatível com o comprometimento de renda estará no patamar dos 18%. Isso ocorrerá se o crédito crescer em modalidades que praticam juros mais baixos e prazos mais longos, como o crédito imobiliário.

Demanda Social  
O Brasil ainda apresenta aspectos positivos em relação à estrutura social: a distribuição de renda tem melhorado, há mais pessoas entrando no mercado de trabalho do que saindo, a população com idade ativa cresce mais rapidamente, importante para o crescimento econômico e para o mercado imobiliário. As pessoas que mudam de classe social ou mudam de fase no ciclo de vida são potenciais compradores de imóveis. A indicação é que o Brasil dos próximos anos deve crescer em torno dos 4% ao ano com crescimento concentrado mais no setor de serviços e menos no setor da indústria. 

Impactos no Setor de real estate  

Crédito Imobiliário  
Considerando que o crédito imobiliário ainda representa uma parcela muito baixa em relação ao PIB, quando comparado com outros países, e por ser uma das modalidades de crédito que mais cresce nos últimos anos, é possível considerar uma margem para maior crescimento. O produto imobiliário ganhou maior espaço em todos os segmentos de renda. Essa situação é resultado da linha de crédito acessível e da população mais consciente do uso deste recurso para o acesso à compra dos imóveis residenciais. Acreditando que a renda deve permanecer subindo e os juros em queda, formata-se um cenário diante do qual verifica-se a tendência de busca de investimentos fora do mercado financeiro e o imóvel para renda apresenta-se como uma opção de destaque.

Demanda Real e Artificial  
A demanda para aquisição de imóveis ainda é grande no segmento residencial, e no comercial pode aumentar caso a taxa de juros continue sua tendência de queda e os aluguéis continuem sua tendência de alta. Os imóveis comerciais representam uma opção de investimento em um ambiente com baixa taxa de juros. Porém, deve ser considerado que uma parcela da demanda verificada no ciclo 2010-2011 não representa investimento de longo prazo (móveis para renda), significando demanda artificial, emulada por especulação sobre os preços. A velocidade de vendas dos novos lançamentos indica que neste momento os investidores locais podem estar tomados, porque no ciclo de alta verificado em 2010-2011 adquiriram unidades fazendo dívidas ainda não repassadas. De uma maneira ou de outra, especuladores sobre preços podem auxiliar topicamente o mercado, à medida que, comprando no lançamento e vendendo no final do período de construção, proporcionam uma espécie de liquidez para os incorporadores. Todavia, com a velocidade de vendas decrescendo, estes estoques podem representar entraves para o desenvolvimento do mercado.

Produtos Financeiros Imobiliários 
Além dos imóveis para investimento, têm sido (e devem continuar a ser) procurados os produtos financeiros com lastro imobiliário. Além da garantia real eles são vestidos com isenção tributária sobre a renda, o que os torna competitivos (exemplos são os CRIs - certificados de recebíveis imobiliários, os FIIs - fundos de investimento imobiliário, as LCIs - letras de crédito imobiliário). Não só os investidores institucionais, mas já se detectam expressivos movimentos de pessoas físicas buscando investir nos produtos financeiros com lastro imobiliário devido às suas vantagens tributárias, à busca por investimentos mais rentáveis (juros mais altos) e pela sensação de que apresentam alguma proteção contra a inflação. Este movimento é positivo para o setor porque representa uma nova alternativa de funding.

Poupança 
A caderneta de poupança tem limitações para gerar recursos de crédito imobiliário e, a se considerar as curvas de crescimento do crédito e dos depósitos de poupança, é um instrumento que se esgota no médio prazo. Porém, há alternativas em análise que podem sustentar a capacidade de suporte da demanda de crédito somente por esta via, como, por exemplo, as mudanças na regra de destinação dos recursos. É provável que a poupança aumente sua arrecadação caso a taxa de juros continue sua tendência de queda.

Estoques e Volume de Lançamentos  
O mercado tem reportado estoques acima do que as empresas esperavam ter neste momento. Observam-se casos de oferta ostensiva de descontos para estimular a aquisição de imóveis. Se considerado o ciclo de negócio de real estate compreendendo três a quatro anos de produção, o período de venda às velocidades ora verificadas chega a um ano, o que é confortável. Entretanto, o costume de liquidar lançamentos em poucos meses coloca um certo stress nas empresas. Para a cidade de São Paulo, ao final de 2011 observam-se estoques para menos de um ano de venda, relativamente baixo, porém mais alto se comparado com os níveis de estoque do ano de 2010. Neste ano de 2012 a tendência é que oferta e demanda estejam mais equilibradas, inclusive levando em conta a contração da oferta anunciada pelas grandes empresas. Observa-se, ainda, que muitos estoques ocorrem em nichos específicos, não indicando uma grande contração de demanda, mas problemas pontuais relacionados com falta de alinhamento [ produto e região x demanda ].

Preço x Produto Adequado  
Considerando o nível de estoques existente, não é razoável admitir que os preços continuem em uma curva de alta acima dos índices de inflação de custos do setor. De outro lado, o crescimento de preços verificado nos últimos cinco anos esteve acima do crescimento das rendas do mercado e essa diferença prejudicou o atendimento da demanda. O preço dos produtos cresceu além da capacidade de pagar das famílias - consequentemente o mercado se desorganizou. Para reorganizar há três possibilidades: juros mais baixos, desconto nos preços, ou ajuste dos produtos daqui para adiante. Nos estoques é razoável admitir que para ganhar liquidez as empresas entrem na fase de descontos. Os novos lançamentos residenciais devem corresponder a produtos diferentes dos que estavam no mercado até o ano de 2011, tendo em vista a necessidade de ajuste à capacidade de pagar do público-alvo. Entretanto, como ainda há estoques, a prioridade deve ser vender os estoques, mesmo comprometendo rentabilidade, para ser possível entrar em um novo ciclo de mercado, com os parâmetros reajustados.

Capacidade de Produção 
As empresas revisaram seus volumes de lançamentos para baixo em 2012, também devido a questões relacionadas à produção (atrasos recentes, escassez de mão de obra e preocupação adicional com produtividade). O setor busca revisar os seus conceitos e parâmetros de produção e controle, seja para aliviar a pressão de surpresas relacionadas com desvios de custos contra os orçamentos, como ocorreu com a maioria das companhias e se refletiu nos balanços de 2011, como para buscar uma contração de custos para repor padrões aceitáveis de rentabilidade, a se considerar o ajuste mais adequado entre os preços e os anseios e a capacidade de pagar dos mercados alvo. No setor de real estate nos últimos cinco anos verificou-se um substancial ganho salarial, associado a uma queda de produtividade, como fruto da pressão de demanda, da falta de treinamento e da terceirização como solução privilegiada de produção. Em comparação com outros países, a produtividade no ambiente da construção civil brasileira é muito baixa, existindo, portanto, margem para ajuste do mercado pelo vetor dos custos.

São membros do Comitê de Mercado do NRE-Poli: Alessandro Olzon Vedrossi, Alex Kenya Abiko, Carlos Terepins, Cláudio Bruni, Claudio Tavares de Alencar, Daniel Citron, Eliane Monetti, Eric Cozza, Fernando Bontorim Amato, João da Rocha Lima Jr., José Roberto Machado, José Romeu Ferraz Neto, Marcelo Vespoli Takaoka, Mario Rocha Neto, Pedro Cortez, Roberto Aflalo Filho, Roberto Sampaio, Sérgio Alfredo Rosa da Silva e Walter Luiz Teixeira,

Firmam esta Nota: Alessandro Olzon Vedrossi, Alex Kenya Abiko, Carlos Terepins, Cláudio Bruni, Claudio Tavares de Alencar, Daniel Citron, Eliane Monetti, Eric Cozza, Fernando Bontorim Amato, João da Rocha Lima Jr., José Roberto Machado, José Romeu Ferraz Neto, Marcelo Vespoli Takaoka, Mario Rocha Neto, Pedro Cortez, Roberto Aflalo Filho, Roberto Sampaio, Sérgio Alfredo Rosa da Silva e Walter Luiz Teixeira, na sessão secretariada por Fernanda Maria Ferreira, que se encarregou de consolidar, na redação desta nota, o tema tal como foi debatido.

Nota do Editor:
O Núcleo de Real Estate [ NRE-POLI ] é a unidade de prestação de serviços à comunidade do Grupo de Ensino e Pesquisa em Real Estate da Escola Politécnica da USP, orientado para a economia e os negócios no âmbito do REAL ESTATE.

Os serviços prestados pelo NRE-POLI são conduzidos por meio da aplicação da doutrina que nele se desenvolve e que evolui continuadamente através dos estudos e pesquisas de seu grupo de professores e pesquisadores em programas de pós-graduação. Desse modo, ocorre uma eficiente transferência de tecnologia da Universidade para o setor produtivo.

O estado da arte das pesquisas em Real Estate no Brasil, inclusive com forte inserção internacional, é hoje produzido na Escola Politécnica da USP.

O Núcleo de Real Estate [ NRE-POLI ] constituiu um Comitê de Mercado, formado por professores e pesquisadores do NRE e profissionais de destaque do real estate, representando seus diferentes segmentos. O Comitê de Mercado se reúne a cada bimestre, para dialogar sobre um tema relevante da economia setorial.

O NRE-POLI também edita dois outros veículos de divulgação de suas pesquisas,  a Carta do NRE e a sua revista, Real Estate: Economia e Mercados. Além disso, o NRE-POLI divulga mensalmente o comportamento das ações das empresas de Real Estate por meio do Índice IRE.
No médio prazo, o NRE-POLI também irá produzir e divulgar índices de preços de mercado, primeiro para edifícios comerciais e, a seguir, para residenciais.

Índice IRE - últimos 12 meses (Clique no gráfico para ampliar)


Um outro canal de divulgação de conhecimento é a coluna mensal de real estate da revista Construção Mercado da editora Pini que o NRE-POLI assina, por meio de seus pesquisadores e colaboradores.

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