terça-feira, 26 de junho de 2012

PROTESTO DO CONTRATO DE LOCAÇÃO POR DESCUMPRIMENTO DAS CLÁUSULAS CONTRATUAIS


O artigo trata do protesto do contrato de locação quando decorre de descumprimento de quaisquer uma das cláusulas inerente ao locatário.

1.  Introdução:

A Lei 9492/1997, não faz qualquer objeção ao protesto do contrato de locação, já que se há uma dívida, pode este ser convertido em título líquido, certo e exigível e, por consequência pode ser levado a protesto.
Art. 1º Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.
Numa interpretação teleológica ao artigo 1º da Lei 9492/2004, um contrato inadimplido seria sim, um documento de dívida, passível de ser levado a protesto.
A partir da leitura dos dispositivos legais acima elencados, tem-se que a melhor interpretação a ser adotada é aquela segundo a qual o legislador, quando estendeu para além dos títulos cambiários, a possibilidade de protesto de "outros documentos de dívida", teve a intenção de que fazê-lo também para abarcar os títulos executivos judiciais e extrajudiciais previstos no Código de Processo Civil e demais legislações suplementares, inserido, nessa hipótese, o contrato de locação, que encontra previsão na Lei 8245/1991.
O Código de Processo Civil elenca em seu artigo 585, os títulos ou documentos que se atribuem a qualidade de título executivos extrajudicial, para fins de execução de quantia certa. Ex: Qualquer documento particular que origine uma dívida, devidamente assinado pelo devedor e/ou por duas testemunhas.
Art. 585 - São Títulos Executivos Extrajudiciais:

I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque;

II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores;

III - os contratos de hipoteca, de penhor, de anticrese e de caução, bem como de seguro de vida e de acidentes pessoais de que resulte morte ou incapacidade;

IV - o crédito decorrente de foro, laudêmio, aluguel ou renda de imóvel, bem como encargo de condomínio desde que comprovado por contrato escrito;

V - o crédito de serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de tradutor, quando as custas, emolumentos ou honorários forem aprovados por decisão judicial;

Vl - a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, Estado, Distrito Federal, Território e Município, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei;

Vll - todos os demais títulos, a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva.
Extraindo-se da redação do artigo 580 do CPC, que diante do inadimplemento do devedor, seja a execução instaurada para que ele satisfaça a obrigação certa, líquida e exigível, como determina o artigo 586 do citado diploma legal, consubstanciada em título executivo.
Verbaliza SÍLVIO DE SALVO VENOSA que:
"Em matéria cambial, o protesto é prova oficial e insubstituível da falta ou recusa, quer do aceite, quer do pagamento, [...]. Segundo a doutrina tradicional, o protesto é um ato formal com finalidade essencialmente probatória, uma vez que evidencia que o devedor não cumpriu a obrigação constante do título. Trata-se de ato jurídico em sentido estrito. O efeito probante do ato decorre exclusivamente da lei.
 Nesse diapasão, há de se levar em conta o novo protesto com finalidade especial. Essa modalidade de protesto é destinada a títulos e documento que a princípio não eram protestáveis, mas cujo protesto serve para atingir uma finalidade ou completar o sentido das obrigações no universo negocial. Em resumo, permitindo o legislador que outros documentos comprobatórios de obrigações e débitos em aberto sejam protestados, busca-se, por meio do ato jurídico do protesto, o aperfeiçoamento do princípio pacta sunt servanda. Nessa modalidade de protesto se incluem, entre outros, sentença com trânsito em julgado, contratos e outros débitos para fundamentar pedido de falência contra devedor comerciante (art. 10 da Lei de Falências)."(VENOSA, Sílvio de Salvo. O Protesto de Documentos de Dívida, in Novo Código Civil Interfaces no Ordenamento Jurídico Brasileiro, Coordenadora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, 1. ed. – Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2004, ps. 124/125.)
Vale dizer que, qualquer documento que represente uma dívida e que esteja apto a uma ação judicial de cobrança (execução judicial) poderá ser objeto de protesto.

2. Do protesto do contrato locativo em decorrência de dívida

Pode-se dizer, que a partir das mudanças engendradas na parte de execução de títulos do Código de Processo Civil, todos os títulos executivos judiciais e extrajudiciais vislumbrados pela legislação processual poderão ser protestados.
Analisando o contrato de locação, que é claramente regido pelo princípio do pacta sunt servanda, em que é passível fixar-se disposições pertinente a locação, inclusive inserir despesas locativas, tais como água e esgoto, força e luz, impostos e taxas, contribuição condominial, além de multas e constituir em mora  em decorrência de infrações contratuais, que são créditos líquidos, certos e exigíveis.
Se for pela interpretação do legislador, há possibilidade de ser protestado o débito do aluguel, desde que seja apresentado o contrato de locação em sua via original.
Ressalte que, segundo o artigo 569, inciso II do Código Civil c/c artigo 23, inciso I da Lei 8245/1991, consiste no direito obrigacional por parte do locatário a pagar na data e lugar em que for ajustado o aluguel e encargos, dando cumprimento ao contrato; assim pelo fato de haver lugar para que a obrigação de pagar certa quantia esteja estipulada, subsiste ao credor o direito de cobrá-la, ainda que em protesto.
SÍLVIO DE SALVO VENOSA expõe que:
"[...] Desse modo, embora haja quem à primeira vista possa sufragar a opinião mais extensiva, o dispositivo do artigo 1º deve ser interpretado restritivamente no sentido de que o protesto é utilizável somente para os títulos cambiários e para os demais títulos executivos judiciais e extrajudiciais, que estão elencados nos arts. 584 e 585 do Código de Processo Civil. Desse modo, doravante, devem ser admitidos a protesto todo o rol elencado nesses dispositivos, entre outros, [...], crédito decorrente de aluguel ou renda de imóvel, [...], desde que comprovado por contrato escrito. Desse modo, por exemplo, o débito resultante da locação de imóvel, comprovado por contrato escrito, pode ser objeto de protesto, tanto quanto ao inquilino como quanto ao fiador, pois a fiança é modalidade de caução e se insere entre os títulos executivos extrajudiciais. [...]"(O Protesto de Documentos de Dívida, in Novo Código Civil Interfaces no Ordenamento Jurídico Brasileiro, Coordenadora Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, 1. ed. – Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2004, p. 125.)
Se é possível extrai do contrato de locação a certeza e a liquidez do crédito, pois a própria Lei de Locações assim o expressa, sendo desnecessário a sua inclusão no Código de Processo Civil, a partir do inserimento do inciso IV no artigo 585, segundo a exposição de motivos do Projeto de Lei 3252/2004 idealizada pelo Ministro da Justiça à época, Dr. Márcio Thomaz Bastos.
Exposa o citado autor (in, Palestra "O protesto do fiador e do inquilino sob o prisma da Lei nº 9.492/97", proferida no SECOVI-SP), que: “Desse modo, por exemplo, o débito resultante de locação do imóvel, comprovado por contrato escrito pode ser objeto de protesto, tanto quanto ao inquilino como quanto ao fiador, pois a fiança é modalidade de caução e se insere entre os títulos executivos extrajudiciais”.
Insta informar que, recentemente foi sancionada no Estado de São Paulo, a Lei 10700 de 29/12/2000, que prevê a possibilidade do registro de impontualidade de dívida locatícia, ou seja, permite ao locador, o direito de protesto do contrato de locação, quando este estiver o locatário e/ou fiador inadimplentes, bem como a inclusão do nome dos devedores nos cadastros restritivos de crédito.
Nestes termos, é o magistério exarado pelo magistrado VENÍCIO ANTÔNIO DE PAULA SALLES:
"A dicção legal é precisa e insuperável. Protestável para esta Lei Estadual, são todos os títulos considerados, pela legislação processual, como TÍTULOS EXECUTIVOS EXTRAJUDICIAIS”.
Consoante NELSON GODOY BASSIL DOWER (in, Curso Básico de Direito Processual Civil, 2ª ed., V.3, p. 74), "esse direito que tem o credor de provocar a execução é direito de agir, é a ação de execução, sempre baseada -repita-se- no título executivo e que nasce quando há o inadimplemento por parte do devedor, dando lugar ao processo executivo".
Encontra-se pacificado frente a doutrina, que os contratos de locação de imóveis, tais como cheques e notas promissórias, estes, passíveis de protesto, representam perfeitos títulos executivos extrajudiciais.
O mencionado processualista, comentando ementário transcrito pela RT 677/163, descreve que "na execução de aluguel, o título executivo extrajudicial não é o documento a que se refere o inc. II do art. 585, mas sim o crédito locatício comprovado por contrato escrito, revisto pelo inc.IV do mesmo artigo”.
Com amparo nos argumentos doutrinário acima expostos, pode-se dizer, que se leva a protesto é a dívida originária do descumprimento de uma das cláusulas constantes no contrato de locação.
Quanto a possibilidade de se protestar o fiador, juntamente, com o locatário, é possível, desde que a garantia fidejussória atribuída ao contrato, seja precedida de solidariedade pelo cumprimento da obrigação, com fulcro na disposição trazida pelo artigo 828, II do Código Civil, mediante cláusula expressa constante no Contrato de Locação.

3. Da divergência jurisprudencial quanto a matéria em análise

O TJSP, assim como o entendimento majoritária da 5ª Turma do STJ ao julgar o RMS 17400, com acórdão publicado no DJ-e em 3/11/2011, que teve o voto vencedor do Ministro Adilson Macabu, não pode ser protestado o contrato de locação, por ser título executivo extrajudicial, ficando vencida a Ministra-relatora Laurita Vaz, que com fulcro em outros precedentes desta Corte, entendia que: 
"... esta Corte Superior de Justiça possui jurisprudência remansosa no sentido de atribuir ao contrato de locação a natureza de título executivo extrajudicial ".
O aresto origina-se de Mandado de segurança oriundo do TJSP, que foi impetrado contra ato do Corregedor Geral de Justiça do Estado de São Paulo, que tornou sem efeito permissão concedida para protesto de contratos de locação aos Tabeliães de Protestos de Letras e Títulos da comarca da Capital, inclusive determinando o cancelamento daqueles que haviam sido lavrados durante a vigência da citada permissão, que por unanimidade foi negado o mandamus, sob o fundamento de que:
 “... expressamente não ficou estabelecido que o contrato de locação de imóvel deveria ser considerado como título executivo extrajudicial hábil a ser protestado, não se pode dizer que o ato praticado violou um direito da impetrante, sendo que foi dada uma interpretação viável ao assunto.
O entendimento externado pela 5ª Turma do STJ, não parece ser muito congruente, haja vista que a dívida, em caso de não pagamento da locação ou de seus encargos, pode ser contabilizada e, levado os cálculos como o boleto de cobrança ao ato de protesto desde que apresentado o contrato original.
Assim, pode-se dizer que é cabível o protesto do contrato de locação, até porque “O protesto, quando devido, é poderoso instrumento que possui o credor para compelir o devedor ao adimplemento da obrigação.
E o protesto será devido sempre que a obrigação reclamada for líquida, certa e exigível.
(...)
Se aos títulos de crédito, documentos particulares produzidos sem a chancela do Estado, oferece-se o protesto como forma de colocar o devedor em mora, ...
(...)
Contudo, além desses escopos, o protesto causa efeito negativo na vida do devedor recalcitrante. A publicidade específica, que causa a restrição ao crédito, leva o devedor a adimplir sua obrigação, tão logo quanto possível, para livrar-se da restrição creditícia.” (REsp 750805, rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ-e 16/6/2009).
Se a própria 3ª Turma do STJ admite até o protesto de sentença judicial, mais ainda se pode admitir o do Contrato de Locação, quando advier dívidas decorrentes de inadimplência, independentemente da interposição de procedimento judicial.
Logo, o locador de imóvel com locatário inadimplente poderá direcionar a protesto o contrato de locação vencido e não quitado.
A competência do protesto será o local de pagamento expresso no contrato, ou seja, a praça de pagamento. Na ausência deste, será adotado o critério do domicílio do devedor.
O locador terá a possibilidade de indicação a protesto apenas do locatário ou do locatário e do fiador.

4. Conclusão

Portanto, conclui-se que a dívida deixada em aberto no contrato de locação, se pode ser cobrada ou executada, possibilidade existe no protesto da mesma, eis que é originária de um contato, e reflexamente, cabível levar-se a protesto o contrato de locação.
O entendimento jurisprudencial da maioria da 5ª Turma do STJ se encontra equivocado, bem como do TJSP, até porque o julgador não pode inovar e nem dar a interpretação, que se encontra dissociada a lei.
A doutrina se perfilha tanto com o entendimento do legislador reformista do Código de Processo Civil, no que pertine aos títulos executivos, quanto ao legislador elaborador da Lei 9492/2004, que admite o protesto do contrato de locação, quando houver dívida oriunda de descumprimento de cláusula contratual.
Razão mais ainda assiste, aos defensores da corrente que admite o protesto do contrato de locação, até porque se é admissível a propositura da ação de despejo por falta de pagamento ou por descumprimento de quaisquer uma das cláusulas constante no contrato de locação, em que se pede o desalijo compulsório do inquilino devedor, dando-se ciência ao fiador.
Pontofinalizando, o protesto do contrato de locação, que é um título executivo extrajudicial, possuidor de força executória, sendo exigível, e a dívida decorrente de descumprimento deste, ser certa e líquida, pode ser realizada nos Cartórios de Protesto de Título, não podendo tais serventias se excusarem de fazê-lo, baseando-se em entendimento duvidoso e isolada de parte da 5ª Turma do STJ. (Grifo nosso)

Autor: Dr. Márcio Antonio Alves
Áreas de Atuação: Direito Civil, Direito do Consumidor, Direito do Trabalho, Direito Previdenciário, Defesa do Consumidor. 
Fonte: meuadvogado.com.br

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