domingo, 28 de setembro de 2014

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO CORRETOR DE IMÓVEIS À LUZ DO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO E DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR


O termo responsabilidade, surgiu inicialmente da expressão sponsio, da figurastipulatio, na qual era confirmada pelo devedor uma obrigação junto ao credor, esta garantida mediante uma caução ou responsor. A partir daí surgiu a relação da expressão “responsabilidade” junto à garantia de pagamento de uma dívida.

Assevera Rui Stoco:
“A responsabilidade civil é uma instituição, enquanto assecuratória de direitos, e um estuário para onde acorrem os insatisfeitos, os injustiçados e os que se danam e se prejudicam por comportamento dos outros. É o resultado daquilo que não se comportou ou não ocorreu secundum ius”.

O indivíduo, ao se deparar com qualquer situação em que seja vítima de ofensa física ou moral, sofra um detrimento qualquer, sinta desrespeitado seus direitos, ou não obtenha o que fora previamente avençado, buscará seu ressarcimento amparando-se no instituto da responsabilidade civil para efetiva retratação ante um conflito.

Na visão de Sérgio Cavalieri Filho:
“A responsabilidade civil é uma espécie de estuário onde deságuam todos os rios do Direito: público ou privado, material e processual, é uma abóbada que enfeixa todas as áreas jurídicas, uma vez que tudo acaba em responsabilidade”.

De início cabe destacar a caracterização da responsabilidade do corretor de imóveis à luz do Código Civil Brasileiro, que o qualifica de modo amplo em seu dispositivo 722, que cumpre transcrever:

“Art. 722: Pelo contrato de corretagem, uma pessoa, não ligada a outra em virtude de mandato, de prestação de serviços ou por qualquer relação de dependência, obriga-se a obter para a segunda um ou mais negócios, conforme as instruções recebidas”

Na dicção do professor Zamprogna sobre o referido artigo:
“Corretagem ou mediação é o contrato pelo qual uma das partes, denominada corretor, obriga-se a obter determinados negócios ou informações acerca dos mesmos para a segunda, denominada comitente, mediante retribuição de natureza econômica e sem vínculo de dependência. \O objetivo do contrato é encaminhar a celebração de outro, a ser firmado entre as partes aproximadas pelo corretor”.

Verifica-se que o contrato de corretagem será sempre de prestação de serviços, podendo ser por prazo determinado ou não, nesse caso o serviço restará concluído após a efetiva conclusão dos negócios recomendados.

Da responsabilidade civil do corretor ante o Código Civil Brasileiro
Nas condições em que não se caracterize consumo ou a possibilidade de aplicação de lei específica, haverá de ser implantado o que disciplina o Código Civil Brasileiro. O corretor de imóveis será responsável por eventuais danos que venha a causar, nos termos do parágrafo único do artigo 723 do mesmo Diploma, incluído pela Lei nº 12.236/10:

“Art. 723 (...) parágrafo único: Sob pena de responder por perdas e danos, o corretor prestará ao cliente todos os esclarecimentos acerca da segurança ou do risco do negócio, das alterações de valores e de outros fatores que possam influir nos resultados da incumbência”.

Na lição de Matiello:
“ (...) incumbe ainda ao corretor alertar e esclarecer o comitente sobre os riscos e a segurança do negócio para cujo encaminhamento buscou a intermediação, prevenindo-o, na medida do possível, quanto aos percalços econômicos e legais que poderá ter pela frente. Se assim não agir, terá agido com culpa e indenizará as perdas e danos experimentados pelo comitente desde que tenha provada relação com a falta dos esclarecimentos que deveria prestar (...)”

O dever de indenizar ficará restrito à comprovação da culpa do corretor, restando evidente que, uma vez que o profissional da corretagem comprove a diligência no que concerne às informações prestadas e assistência exigida, fica protegido quanto ao dever de indenizar. Na medida em que o dano não tiver relação com a atividade de intermediação, o mediador ficará isento de reparar eventuais danos sofridos pelo comitente, em virtude da frustração do negócio.

Da responsabilidade civil do corretor perante o Código de Defesa do Consumidor
Nos eventuais casos em que configurem-se relações de consumo aplicar-se-á Lei específica, mais precisamente o Código de Defesa do Consumidor.

Em virtude do caráter protetivo e igualitário do Diploma haverá reflexos relevantes. A mais evidente diferença será em razão do enquadramento da conduta do corretor que implicará na Teoria da responsabilidade objetiva a qual não fica condicionada a comprovação de culpa por parte do agente, mas sim apenas a relação do dano causado e o nexo de causalidade.

O artigo 14 do CDC já delimita acerca da responsabilidade sem culpa:
“Art. 14: O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos”. (grifo nosso)

Contudo, o mesmo dispositivo 14 do Diploma em seu parágrafo 4º excepciona à regra em relação aos profissionais liberais, portanto se o corretor atuar de maneira autônoma e for contratado diretamente pelo comitente sem qualquer vínculo com empresa especializada do ramo, incidirá a regra da responsabilidade civil subjetiva, que requer a comprovação de culpa do agente.

Quanto às vantagens ou diferenças sobre a incidência dos diplomas, estas estarão evidentes quanto às nulidades nos contratos, ônus da prova e solidariedade.

No Código Civil, reza a Teoria subjetiva da responsabilidade, cabendo ao comitente o ônus da prova, dessa forma fica nítida a vantagem do consumidor nos casos em que a norma protetiva possa incidir.

Já na dicção do Código de Defesa do Consumidor, ao corretor cabe o ônus da prova na finalidade de comprovar que não houve defeito no serviço prestado, caso não seja possível arcará com a obrigação de indenizar.

É cediço que, no Código Consumerista a oferta se vincula, ou seja, o que foi ofertado deverá efetivamente ser cumprido mesmo que, nas relações de intermediação, não tenha sido firmado contrato de corretagem.

Pelo teor do artigo 20 do Código de Defesa do Consumidor, havendo qualquer disparidade entre o que foi anunciado e o que foi efetivamente prestado, incorrerá em vício do serviço, pois a oferta é vinculante para o fornecedor.

Para Rizzato Nunes:
“(...) Entretanto, a Lei não ter tratado expressamente de vício de quantidade de serviços, há que subsumi-los à norma consumerista, conferindo-se ao caput do artigo 20 uma interpretação extensiva, máxime porque as hipóteses arroladas pelo legislador são sempre exemplificativas, como medida de garantir e ampliar a proteção do consumidor”.

Responsabilidade civil do corretor de imóveis quanto à documentação, transação imobiliária e propaganda do imóvel
Para que se dê início ao contrato de compra e venda é necessário que sejam apresentados alguns documentos com escopo de verificar-se acerca da idoneidade tanto dos promitentes quanto do imóvel a ser negociado.

No que compete ao corretor de imóveis, a dissociação entre o fornecimento das informações essenciais e a apresentação da documentação se torna impossível, uma vez que, para que todos os comunicados imprescindíveis sejam feitos haverá de se ter ciência prévia da documentação.

Já a transação imobiliária somente terá iniciado seu procedimento mediante o recolhimento de toda a documentação pertinente ao bem imóvel a ser negociado.

O corretor deve ter conhecimentos específicos sobre o imóvel, quanto à sua localização, imediações, dimensões, estado de conservação, eventuais vícios na construção que sejam de fácil constatação, incidência de luz solar, possibilidade de enchentes entre outras.

A respeito do risco do negócio, ao intermediador caberá a ciência daqueles possíveis de ocorrer, bem como das eventuais alterações de valores e quaisquer assuntos que possam vir a abalar a efetiva concretização do negócio.

As certidões fiscais do imóvel, e relativas ao próprio titular são exigidas. Paralelamente pertinente se faz a apresentação de outros documentos para a efetiva transação imobiliária, em razão da situação do imóvel, quais sejam: manifestação escrita do locatário quanto à desistência do direito de preferência, autorização judicial (nos casos de inventário, venda de bens de menores, incapazes, etc.), carta de arrematação (para bens adquiridos em hasta pública), termo de habite-se (para imóveis novos), certidão do cartório de registro de imóveis constando eventuais averbações, declaração de inexistência de débito condominial (fornecido pelo síndico).

Munido de todas as informações e documentações, o corretor as passará integralmente ao promitente comprador, mesmo ensejando em depreciação do imóvel, deixando à conveniência do cliente a conclusão ou não do negócio. Dessa forma, ao intermediador não se atribuirá responsabilidade.

Caso não o fizer, será caracterizada a culpa por parte do corretor a quem será imputado os rigores previstos em Lei.

Assim sendo, somente responderá civilmente, aquele que produzir atos que gerem dano aos seus clientes, quer por imperícia, imprudência, negligência ou dolo.

Responsabilidade sobre a propaganda do imóvel
Na oferta e publicidade do imóvel, por intermédio de anúncios de qualquer natureza, a responsabilidade do corretor também se aplicará. O agente imobiliário é responsável por todos os aspectos que envolvam a propaganda do imóvel a ser oferecido, pois os meios de se alcançar o consumidor, quando não observados os preceitos legais e éticos, podem acarretar em eventuais demandas judiciais.

Deve-se evitar a falsidade, bem como a possibilidade de dupla interpretação ou também que se induza o consumidor a acreditar em algo diferente da realidade do produto oferecido.

Para que se evite tais abusos, há normatização pertinente, referente às regulamentações da atividade, nesse sentido cabe ao corretor ter todo o esclarecimento e atenção para que a propaganda do imóvel não enseje em qualquer infração.

O Código de Defesa do Consumidor na Seção III – Da Publicidade, já protege o consumidor nesse sentido conforme artigos 36 e 37.

Remetendo-se ao que foi exposto acerca da responsabilidade civil subjetiva, cabe salientar que, enquadra-se nesta modalidade de responsabilidade à apresentação de documentos, informações e transação do imóvel, diferentemente do que aponta-se em relação à propaganda, mesmo que incida sobre os profissionais liberais, nos termos do artigo 38 do Código de Defesa do Consumidor, in verbis:
“Art. 38: O ônus da prova da veracidade e correção da informação ou comunicação publicitária cabe a quem as patrocina” (Grifo nosso)

Desse contexto, podemos observar que o corretor de imóveis atua não só nas suas atividades consideradas típicas, mas também nas atípicas como nos casos da propaganda do imóvel, logo as responsabilidades tanto objetivas quanto subjetivas devem ser apuradas de acordo com o caso concreto, com intuito de adequar o diploma legal pertinente a cada situação em particular.

Considerações Finais
Relevante se mostra o enredo em razão de os negócios imobiliário movimentarem quantias vultuosas que podem acarretar em eventuais frustrações.

No que tange à responsabilidade civil subjetiva do corretor de imóveis, analisando o Código Civil, artigo 186, podemos inferir que esta espécie de responsabilidade está intimamente ligada à culpa e ao dolo, o que nos propõe dizer que a vítima deverá comprovar que o agente teve conduta culposa ou dolosa, possuindo obviamente nexo de causalidade entre o dano causado e a ação ou omissão.

Já no Código de Defesa do Consumidor, especifica-se a atuação do profissional liberal, mais precisamente no parágrafo 4º do artigo 14, quando menciona acerca da responsabilidade de tais profissionais pelos danos causados por consequência dos serviços prestados, determinando que, nesses casos haverá de se impor à responsabilidade subjetiva, comprovando a culpa.

Essa linha imposta pelo Código consumerista cria exceção à regra da responsabilidade objetiva que visou a proteção do consumidor mais vulnerável. Tal dispositivo afasta os profissionais liberais da responsabilidade civil independente de comprovação de culpa pelo fato ou vício do serviço.

Com análise nas Teorias objetiva e subjetiva, há que se observar o caso em concreto, quando frente à prestação de informações, apresentação da documentação e da transação imobiliária, por tratar-se de conduta de natureza pessoal, em regra foi observado a aplicação da Teoria subjetiva exigindo a comprovação de culpa ou dolo do agente, conforme o Diploma Civil preceitua. Por outro lado, a responsabilidade objetiva será imposta quando inserido o conceito de propaganda, desse modo incidirá o Código de Defesa do Consumidor.

Por derradeiro, cabe relembrar as hipóteses aludidas:

a) Quando referente à documentação, informação e transação imobiliária a responsabilidade civil será subjetiva, sendo necessária a comprovação de culpa ou dolo por parte do agente;

b) A responsabilidade civil, nos casos em que incidam a atividade de propaganda, será a objetiva.

Referências Bibliográficas
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 9ªed. São Paulo: Atlas, 2010.
MATIELLO, Fabricio Zamprogna. Código Civil Comentado – São Paulo: Ltr., 2003
NUNES, Luiz Antonio Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor.
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade Civil: doutrina e jurisprudência. 7ªed. São Paulo:Revista dos Tribunais.

Raul Petrilli Leme de Campos - Acadêmico do 10º semestre da Universidade Presbiteriana Mackenzie
Fonte: Artigos JusBrasil

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